A passagem do Ói Nóis pode servir de âncora no zelo para com a cena, a presença de ator, a criação coletiva e a defesa incondicoinal de um modo de fazer e pensar o teatro sem jamais dissociar arte e vida.
O retorno não acontece sob a rubrica do Festival, mas contracena com ele de forma arrebatadora. Agora, é vez de celebrar o Teatro de Rua na perspectiva de um dos coletivos brasileiros que mais dignidade empresta ao gênero. Ele bebe em tradições, mas não teme recriá-las, como o faz com tirocínio poético em O Amargo Santo da Purificação - Uma Visão Alegórica e Barroca da Vida, Paixão e Morte do Revolucionário Carlos Marighella.
Na sequência de quadros vivos, transbordam cenas que vão e vêm numa onda de fluxo e refluxos a envolver o pedestre no espaço da praça, resultando um retrato desbotado do Brasil no século XX, seus regimes de exceção.
É Teatro de Rua elevado à categoria de arte como poucas vezes nos deram notícias a historiografia cênica brasileira, registramos num artigo publicado no final de 2008 na revista Cavalo Louco, iniciativa editorial independente do Ói Nóis.
“Como em toda obra erguida na Terreira da Tribo, a sede do grupo, mesmo se fruto de uma Oficina, O Amargo Santo da Purificação... é sustentado por sólida base de pesquisas teórica e documental. Todos os 25 atuadores dessa encenação, além do seu corpo técnico, têm ciência do objeto demasiado humano com o qual estão lidando. Por isso o domínio absoluto nos mínimos detalhes da composição musical variada, densa e lírica na medida dos atos; da confecção de bonecões disformes; das máscaras a replicar o mundo animal em metáforas mais que perfeitas para o espectro político (ratos, galinhas, macacos); da costura paciente em crochê; e dos triciclos lúdicos que lembram as carruagens romanas. Ou seja, empresta-se ao fazer teatral um tanto do ofício do artesão”.
Num segundo trecho: “É antológica a forma como esses atuadores reconstituem a linha cronológica, os momentos históricos cruciais nos planos pessoal e coletivo. Concebe-se de forma didática, na melhor acepção, uma evolução dos fatos e afetos em torno da figura de Marighella. A transposição do documento para a cena (documento entendido como levantamento de todo o material que subsidiou a montagem) não resulta decalque. À dramaturgia que costura poemas do próprio personagem-título, o Ói Nóis comete intertextualidades. Tece minúcias que atravessam os números musicais, em solos e coros, desfraldam estandartes e alcançam um registro fino na preparação dos intérpretes, na projeção da voz, na expressão do corpo, do olhar, do rosto, das sobrancelhas, um redobrar de atenção que o Teatro de Rua pede porque in loco, desarmado de macetes, como o grupo está calejado de saber”.
E num terceiro: "Em sua unidade-caleidoscópio, à la Glauber Rocha, a contracenar Corisco, Getúlio Vargas, Médici, o cancioneiro de Vandré, a manipulação do futebol no 'pra frente, Brasil', a crença absoluta na Liberdade encarnada na atuadora-menina vestida de branco, em meio a soldadinhos no chão e coloridas bexigas soltas no céu, a aventurosa Tribo projeta um documentário épico monumental sobre a história contemporânea do Brasil."
Há um clipe do espetáculo no YouTube: http://www.youtube.com/watch?v=FV-0u_lqU08.
A apresentação é na quarta-feira dia 18, horário de almoço, mas já na terça-feira dia 17, às 14h, acontece o workshop Vivência Teatral com o Ói Nóis Aqui Traveiz; e às 20h, no mesmo local, os integrantes do grupo conversam sobre sua trajetória. O endereço é o da Caixa Cultural Curitiba (Rua Conselheiro Laurindo, 280, no centro), instituição que subsidia a turnê nacional por Salvador, Curitiba, depois São Paulo (dias 1º e 2 de abril, na Praça da Sé), Brasília (7, 8 e 9 de abril) e Rio de Janeiro (14 e 15 de abril).
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