20 caminhos entre os 290 do Fringe - por Valmir Santos

Sugerimos alguns espetáculos ao espectador que acompanhará o Fringe a partir desta quarta-feira, dia 18. Os critérios são subjetivos. Assistimos a algumas produções, acompanhamos a trajetória de determinados artistas, admiramos certas dramaturgias, fomos provocados em ousadas intervenções... Mas há muito por descobrir. Existem mesmo mais mistérios entre a errância e o erro do que supõe nossa imaginação - e a dos artistas.


Amêsa
Produção da Companhia de Teatro Gente, de Salvador, com texto do escritor angolano José Mena Abrantes. A personagem do título narra sua história a partir das marcas que ficaram em seu corpo e em sua alma.

Amoroscuro
A InsanaCena, de Ouro Preto, apresenta sua versão teatro físico para El Publico, de García Lorca, que o XPTO montou no ano passado em São Paulo. Comunhão entre o surrealismo e a biografia do poeta andaluz.

O Anjo da História
Nova investida do dramaturgo Celso Cruz e dos atores Marcos Suchara e Dill Magno, integrantes da Companhia do Cão, de São Paulo. Dão corpo e voz ao pensador, judeu e marxista Walter Benjamin a poucas horas, dias de cometer suicídio por causa da perseguição nazista. São ideias que ajudam a ler a história contemporânea - e às quais não falta humor.

Árvores Abatidas ou Para Luís Melo
A atriz Rosana Stavis (foto abaixo) surge em registro tragicômico, após mergulhar em Sarah Kane e Jon Fosse. A interpretação esbanja domínio técnico para transitar de uma nota vocal à outra na hora de cantar, bem como equilibrar-se na variação de humores da corrosiva, triste e hilária figura da protagonista da história metateatral escrita pelo austríaco Thomas Bernhard (1931-1989). Na última mostra Cena Breve, escrevemos sobre Árvores Abatidas em http://mostracenabreve.blogspot.com/2008/11/inconsonncia.html.



Burdo
O trabalho de rua do grupo The Pambazos Bros, de São Paulo, entrelaça o circo a outras linguagens. Pancho e Emiliano são dois mexicanos típicos, machões, bigodudos. Depois de dar à platéia mostras de sua virilidade, eles decidem reconquistar a bela Maria Lupita, que casualmente está na platéia.

A Capital Federal
A Companhia Teatro de Jó, de São Paulo, visita um clássico da dramaturgia brasileira, de Artur Azevedo (1855-1908), o maranhense que escreveu: “Quando eu morrer, não deixarei meu pobre nome ligado a nenhum livro, ninguém citará um verso meu, uma frase que me saísse do cérebro; mas com certeza hão de dizer: ‘Ele amava o teatro’, e este epitáfio moral é bastante, creiam, para a minha bem-aventurança eterna”. A comédia retrata a vinda de uma família do interior de Minas Gerais para o Rio no começo do século XIX.

Canoeiros da Alma
Pesquisador do teatro de rua, Narciso Telles dirige o espetáculo de Uberlândia concebido a partir de várias leituras do universo dos moradores às margens do rio no Vale do Jequitinhonha.

Delicadas Embalagens
A investigação cênica mais recente da CiaSenhas de Teatro (foto abaixo) oscila o trágico e o cômico para narrar e vivenciar a intimidade e as perdas de uma família de pessoas muito jovens, adolescentes trôpegos a cuidar dos filhos e administrar o cotidiano de solicitações. Sueli Araujo e os atores-criadores imprimem inquietação em tudo que fazem, lá se vai uma década.

Dias de Campo Belo
O Pequeno Repertório de Torneado, dirigido por William Costa Lima, de São Paulo, fala de personagens masculinos que tentam modificar o curso de sua existência e colocar em relevo tudo o que passou despercebido.

Escaparate
Intervenção do Erro Grupo, de Florianópolis. Propõe um percurso pela arquitetura urbana (foto abaixo) inspirado em Pavlovsky, Bishop, Ionesco, Jenny Holzer, Qorpo Santo e Beckett. O diretor é Rodrigo Sember.

O Evangelho Segundo São Mateus
Edson Bueno dirige sua companhia em ritmo de "teatro como jazz" nessa performance interativa. O excerto bíblico é associado ao Oitavo Poema do Guardador de Rebanhos, de Fernando Pessoa.

Fala Comigo Como a Chuva
Um Tennessee Wiliams que pulsa a ação física entre palavras, silêncios e desejos. Um casal abraçado à solidão. E o espectador, a eles. Samira Ávila e Luiz Arthur vêm de Belo Horizonte para dar vida a esse rito de juventude com a Companhia Teatro Adulto.

Los Juegos Provechosos (Incríveis Réplicas de Dinossauros Robotizados em Tamanho Natural)
A Companhia Silenciosa (foto abaixo) comete uma “cena” das mais provocadoras e fundamentais. O título de implicações épicas risíveis desde largada, é um trabalho que veio para embaralhar as certezas e incertezas do lugar do teatro, do ator, do público, do cidadania (porque na dimensão da pólis) e da ética coligada a uma estética. Tudo coerente com os rumores dos seus projetos desde 2002. Uma intervenção pública que dá o que falar, e sobre a qual escrevemos em http://mostracenabreve.blogspot.com/2008/11/o-ltex-o-esguicho-e-capela-e-o-contrato.html.

Melan & Colia
Comédia que pretende refletir sobre o risco que o Estado representa aos cidadãos caso estes não assumam suas responsabilidades políticas. Com os atores Andy Gercker e Pagu Leal.

Na Verdade não era o Sinal de Vai Tomar no Cu
Não confundir com o festival de besteiras que assola o Fringe com os títulos de peças locais, invólucros proporcionais aos conteúdos. O que está em jogo aqui é o experimento narrativo minimalista pela pena de Luiz Felipe Leprevost e direção de Nina Rosa Ruski. Três banquinhos, três moças, três figurinos roxos e tons de luz idem. Imóveis, sentadas, levantando-se em raros instantes, elas fazem o espectador mergulhar num fluxo que puxa para cá, puxa para lá e atualiza um pouco o espírito das transmissões radiofônicas de outrora em que o ouvinte, ou o grupo de ouvintes, deixa-se levar pela voz. Projeto da Companhia Provisória/Os Iconoclastinhas, fusão nascida em 2008. Também escrevemos em http://mostracenabreve.blogspot.com/2008/11/fala.html.

As Ondas
O trabalho em demonstração de processo reúne artistas dos mais instigantes na cena teatral curitibana dos últimos anos (Christiane de Macedo, Lori Santos, Raniere Gozalez, Simone Spoladore e outros), sob os auspícios da Sussurro Companhia de Teatro. Seis personagens, seis monólogos que se propõem a compor um ensaio sobre o isolamento humano.

Papel amassado, sonho revelado...
Artistas de São Bernardo do Campo saúdam a história da septuagenária Efigênia Ramos Rolim, figura cativa da Feirinha que acontece aos domingos no Largo da Ordem, centro de Curitiba. Sua filosofia instintiva de reaproveitamento dos papeizinhos de bala embute sentimento universal que existe em todas as mulheres, acredita o diretor Eduardo Salles Ulian.

A Ronda
O submundo do crime no Rio de Janeiro sob ponto de vista de dois policiais, Noronha e Magaiver. Direção de Alessandra Vannucci, a mesma do bem elaborado A Descoberta das Américas, o solo com Julio Adrião que passou pelo Festival em 2006.

O Sono do Fauno
A Companhia de Teatro Os Shakespirados (foto abaixo), de Teresina, traz uma demonstração de processo que recria um poema dramático de Stéphane Mallarmé, escrito aos 23 anos e recusado para o teatro. Um jovem modelo de 23 anos, que aguarda o embarque em New York de volta aos sertões, dorme e tem um sonho priápico com ninfas, no final do qual descobre uma grotesca transformação. O texto baseia-se na "tridução" do poeta concretista Décio Pignatari e na obra de Mário Faustino.

Uma Estória Abensonhada
O ator e pesquisador Eduardo Okamoto, de Campinas, dirige o Grupo Camaleão de Pesquisa em Teatro, vindo da cidade gaúcha de Santa Maria, onde leciona. Em 1926, o rico comerciante Mohamed Pangi Pathel despende sua fortuna para festejar, em praça pública, o matrimônio de seu único filho. Festa igual nunca mais se veria naquelas paragens. Nos trinta dias de duração dos festejos a ilha inteira vinha e se servia, às arrotadas abundâncias. Em final surpreendente, o ismaelita nos segreda os reais motivos de tão inesperada celebração.